terça-feira, 30 de dezembro de 2008

A minha Terra

Moçambique é terra quente. Húmida e verde. É um pedaço de África. É parte do mundo. Moçambique é terra sofrida, vivida, invejada.
É a terra que piso, que olho todos os dias, é o ar que respiro.
É esta gente que te faz ser especial, diferente. É esta pobreza inacabada e sem fim que te transforma, que te amadurece.
Moçambique é um pedaço de terra africana, é a liberdade que não existe, é o sofrimento cravado a sangue. Moçambique é a ferida de uma guerra. É a mistura de negros e brancos.
É a terra preta, é um azul quente. Traz na simplicidade o respeito, no actos a verdade, na transpiração o cansaço de vidas.
Moçambique é hoje a minha terra.

O Gatinho


Este dia começou mal. Muito mal. Para mim começou pessimamente, talvez para muitos fosse banal o que eu vi. Para mim não foi.
Estou a sair de casa, no meu jipinho e tenho um gato bebé esticado, altamente ferido, no meio da rua e ainda vivo. Ainda me custa falar nisto. Tá o meu chefe à minha frente (vive na mesma rua) e vê-me, dentro do carro, com uma lágrima no canto do olho. Que merda. Eu não choro.
Tou agora no banco, completamente perdida, com uma chávena de chá à minha frente e uma vontade incontrolavel de desaparecer. E eu que até tava bem disposta ontem. Que até tive progressos incríveis no mundo empresarial, que até fui para os copos com amigos e vi estrelas. Que merda. Tou aqui, sozinha com o meu chefe a preparar-me para fazer o rescaldo do ano. Ouço lá do fundo alguém a gozar comigo: “coitadinho do gatinho”.
Acho que vou levar pelo menos um dia para esquecer esta tragédia. Vou. E o pior querem saber? Tava a empregada da vizinha sentada à frente do gato a fazer tranças na filha. Isto não é normal. Ou sou eu que não sou normal?Boas entradas para vocês. Eu vou tentar sair de fininho.

O Malato na busca da Felicidade


Não me venham dizer que o Malato do Jogo Duplo e de outros programas afins, é mau. Não é pá. O tipo é do melhor que a televisão portuguesa tem. O tipo é o Tipo.
Vejamos a situação económico-financeira de Portugal. Vejamos. Tá péssima, aliás, o mundo tá péssimo. Tá tudo virado de pernas pró ar porque, um dia, decidiu-se que o Estado em nada deveria regular a economia, quem regula é o capitalismo selvagem. Os políticos e pensantes de todo o mundo reúnem-se, discutem e tomam medidas. Tomam as medidas que nunca tomaram, porque não há memória de uma crise tão acentuada. Os indicadores da conjuntura portuguesa têm revelado desaceleração do investimento e do consumo privado. Isto dizem os indicadores porque a verdade é outra, a verdade é que o português gosta de xofar, isto é, gosta de mostrar, viver de aparências e lá vai sobrevivendo. Ora Bem, isto são histórias. Vamos ao Malato.
Ora vejamos mais uma vez. Este homem é o símbolo da felicidade. É o herói português que conseguirá despoletar a luz ao fundo do túnel para todos os portugueses, desde os velhos do Restelo às Barbies da Linha. Por mais mãos invisíveis (Adam Smith) que os gurus do capitalismo introduzirem na economia, por mais valor que agora produzam ou tentem produzir, é preciso que o povo sinta estas intervenções e aumente os índices de felicidade. É aqui que entra o Malato. Entra como um agente interveniente. Um agente regulador ou atenuador da crise. Vejam, o Malato tá sempre bem disposto e transmite-o. O Malato é simples, genuíno, espontâneo, barraqueiro, apresentador, influente, bem falante, culto e gordo.

Analisem outros países. Tomemos como exemplo a atitude do povo Moçambicano. Têm ideia do que, em menos de um ano e meio se passou neste País? Ora deixem-me enumerar sumariamente:
Cheias »»» fome »»» mortes »»» desalojados;
Aumento dos combustíveis »»» Aumento dos transportes públicos »»» revolução;
Explosão do Paiol da Beira e de Maputo »»» mortes »»» feridos »»» desalojados »»» traumas;
Terramoto »»» desalojados »»» feridos »»» traumas.

Agora, analisem o posicionamento deste povo em termos de satisfação/ felicidade. Reagiram na maior. Passaram por cima. Ultrapassaram, sobreviveram, beberam e fizeram filhos. Riem-se das situações desastrosas. Bola para a frente. Que fazer?
Agora imaginem se o Malato não existisse em Portugal. Se não existisse tínhamos 100% dos portugueses tristes, pessimistas, sofredores mas gastadores.
Acredito na criação de mais Malatos e SPAs de terapia a favor da felicidade e do optimismo. Os portugueses deverão despertar o que de melhor há em si e se para isso é preciso ver a RTP todos os dias, então que se veja.

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

O Muro das Lamentações


Realmente há algo de estranho em mim. Ora vejamos em poucas palavras o que tenho escrito na testa: usem e abusem. Sim, abusem, perguntem, peçam opiniões, encostem o ombro no meu ombro, chorem.
Já lá iam uns belos anos sem ver alguns dos que foram para a metrópole estudar, já lá se iam uns 360 dias (ano comercial para ser mais breve) vezes alguns números primos, e voilá, reencontramo-nos, todos crescidinhos, responsáveis (nem todos), curtidores, solteiros, grávidos, estudiosos, baldas, tudo o que de bom e mau há na Terra.
Já lá se iam estes anos todos e de um momento para o outro vejo-me, em plena noite, toda fabulosa, a dar conselhos. Mas isto é normal? Será que estou a envelhecer e não sei? Será que transpareço muita maturidade, calma, responsabilidade? Ai Jesus que se me apaga a luz. “Não é muito aconselhável namorar com a colega do escritório, pois não?” Não, pá, é péssimo, é o pior erro que algum mortal poderá cometer neste paraíso. Tá malllllll, tá erradooooooooo. Brô, tá malllllllll.
“Não é muito bom mudar de emprego de três em três meses pois não Preta?” Não, tá mal, tá errado. “Preta, tou farto da rotina do meu emprego. Vou mudar. Achas que devo?” Meu querido, a rotina é uma enfermidade inevitável no mundo empresarial, sabias? Vais lá sempre parar, acredita.
Bem, lá tava eu, faziam fila, atropelavam-se e gritavam: “eu também quero uma dica. Pretaaaaaaaaaaaaa!!!!!!!! Uhhhhhhhhhhhhhh”.
Estou verdadeiramente preocupada comigo. Acho que vou tatuar o meu corpo todo, fazer 3 piercings, rapar o cabelo, despedir-me, rasgar a tese, abandonar os meus pais, deixar as causas humanitárias e vou viajar de mochila às costas, vou para um mosteiro criar tigres. Vou pensar em mim.
E no meio desta Porra toda, vejo-me perdida no meio de betinhos a falar das famílias ricas de Cascais e a tentar discutir um assunto inteligente com uma Barbie da Linha. A tentar, a tentar, eu tentei não digam que não, eu tentei. Eu tentei descobrir como é que alguém está a fazer um PHD sem nunca ter trabalhado. Trabalhas em quê? “Eu não trabalho, faço investigação!” Bem, esta foi do melhor, esta só no programa de domingo da TVM (Televisão de Moçambique).

De facto é uma boa. Eu também vou entrar nessa. Vou agora levantar-me, encher o peito de ar, vou com aquele andar de modelo, vou sentar-me na secretária do meu chefe e vou dizer: Dr., não quero trabalhar mais porque quero fazer investigação. Ponto.


Vou vestir-me à dondoca, vou falar de banalidades, vou gastar as minhas poupanças todas em materialismo, vou andar por aí sem acentar, vou ser uma mulher normal.

domingo, 28 de dezembro de 2008

A chuva


Chove tanto lá fora. Chove sem parar. É triste ver o dia assim, é triste ver África molhada. Tudo fica inundado lá fora e eu olho, observo. Adoro ver chover, faz-me sentir bem, serena, calma…….
Não me imagino hoje a viver numa cidade diferente desta. Mesmo com tudo o que de mau aqui encontro, já não consigo. Eu preciso disto, do mar, do calor, do verde, da simplicidade, das dificuldades, eu preciso de África. Eu preciso de coisas dificeis, que me dêem luta. É aqui que eu me vejo, potente, grande, realizada. E eu sei que África precisa de mim, precisa de ajuda. Este País está sedento de talentos, de pessoas sérias, genuínas e corajosas.
Eu já não me imagino a viver numa janela sem vista para África.

E eu ali estava, parada, a chuva escorria-me pelo vestido, os cabelos molhados, as lágrimas saltavam para o chão. E eu ali estava. Estava tão eu, tão bem. Vou ficar.

sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

O Peru

Já passou o Natal. Para mim já passou e só regressa o próximo ano. Mas espero eu que regresse sem o Peru. Sem Peru por amor de Deus. Já ontem estávamos todas, lindas de morrer, as primas, na cozinha a beber Cabernet Sauvignon e qual é o meu espanto quando vejo o Peru, inteiro no forno, cheio de maçãs no rabo. A goela cozida, o peito inchado, as asas caídas. Ai não. As coisas pioraram quando decidiram que eu ia cortar o Peru. Não primas, não, isso eu não faço, nem que me paguem um milhão de dólares e me ofereçam uma casa na praia. Não.
Lá estávamos, todas, já com os copos, e eu, eu com a faca na mão. O pior é que eu sei cortar o Peru, esse é que é o problema. As tardes em casa da avó a limpar o pó ensinaram-me muita coisa, uma delas foi, a mulher deverá saber a lida da casa e deverá saber servir o homem. Ya, eu sei servir o homem, mas cortar o Peru, isso já é outro trauma.
Conclusão, a Preta desistiu na hora H, a hora em que a minha tia entra de copo na mãe e diz, ah o Peru, que bonito, que lindo, eu corto-o. Corta tia, corta que eu não como. Estragaram-me o resto do dia quando, já à mesa, falam da morte do Peru e da bebedeira do Peru. Na mesa, a sorte foi o resto do bacalhau, o bolo de milho e o vinho. Sim, porque a Preta é um bicho raro de se encontrar por aí, a Preta não come animais que foram bebés, ou melhor, que não gozaram a infância.
O próximo Natal regressará em formas diferentes. Vou ser diferente. Vou. O próximo Natal não há Peru.
Passada esta quadra festiva maravilhosa, em que meio mundo anda descalço, com fome e um quarto do mundo anda a passear de Ferrari, iniciam-se agora os preparativos para o ano novo. As mentes estão totalmente concentradas na festa do ano. E eu, eu cá ando, para além de traumatizada com a história do Peru, ando super asmática, doente. E não paro. Ando a percorrer as capelinhas todas. Tudo me liga, tudo me convida, tudo me chama…. E eu doente. Claro que, ontem tinha que morrer.
Depois de ter afastado um mosquito em pleno Dolce Vita e ter sido atacada por um tipo que pensou que eu o estava a cumprimentar e ficou meia hora a dizer que os meus olhos eram lindos, fui parar à clínica.
Cá estou eu, cá estou eu a tomar, ora bem, deixem-me contar, seis comprimidos diferentes e todos ao mesmo tempo.
Cá estou eu a preparar-me para a Festa.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

A Betty Boop


De facto o Natal é uma época de consumismo. Onde só pensamos nos mais próximos. Na mãe, no pai, no irmão, na tia, no piriquito e no gato (para quem tem). Pensamos nas pessoas que estão connosco 365 dias por ano. Que nos vêm todos os dias. Que nos abraçam, que nos beijam, que nos conhecem.

Eu reparei o quão ridícula é esta altura das nossas vidas, quando me deparei, na casa de uma amiga, com a árvore de natal repleta de prendas para os cães. Com direito a papel de embrulho xpto. Eu reparei, nesse dia, que estamos todos perdidos. E olhem que eu gosto de animais, sem dúvida.

É nestas alturas que fico demasiado revoltada. Porque ajudo os que mais precisam mas dificilmente arrasto comigo multidões. Ajudo sozinha e fico feliz por isso. Deixo de fazer mais um PPR porque deliro quando entro no Lar da Nossa Senhora dos Desamparados e recebo um abraço caloroso das freiras e uma picada dos seus bigodes.

É nesta altura das nossas vidas que sinto a falta da minha familia. É nestas alturas que adoraria estar em frente à lareira a ouvir as histórias do passado, a conhecer África, a delirar com Moçambique. Eu queria um dia normal, sem prendas. Eu queria um dia com o meu avô. Os dois, sentados a fazer zapping e a comer biscoitos de azeite. Os dois calados. Porque eu nunca precisei de falar para ele sentir. É nesta altura que me vejo sentada na mesa da cozinha da minha tia a falar do meu MBA e do PHD dela. É nestas alturas que me chateio com ela porque está com quatro tachos no fogão, a cozinhar quatro pratos em simultâneo e eu penso: Será que alguma vez conseguirei fazer esta profecia? Nem com o MBA lá chegarei.

De facto, somos todos uns merdas (já diria o meu pai em alto e bom som), somos egoístas e vaidosos. Vocês, capitalistas, não sabem o que é estar longe da família, não sabem o que é lidar diariamente com a pobreza. Não sabem o que é ser impotente a esta realidade.

É nesta altura do ano que somos os sete pecados mortais em carne e osso.
É no Natal que somos a Betty Boop.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

A Vida


Ela odeia que lhe toquem no umbigo. Ela odeia mexer em umbigos. Acreditem que o seu odiar é perigoso, devastador, mortífero. O umbigo dela é perfeito, redondo, tem a Vida, alimenta a Vida. O umbigo dela já não é só dela. É dos dois. E os dois terão que se decidir.

A Vida é uma montanha de ocasiões, encontros, procuras, desejos e mágoas. A Vida é tudo o que criamos, que partilhamos, que somos. A Vida é a origem do futuro. A Vida não é nada mais do que o resultado das loucuras. A Vida agora é o umbigo dela.

Ela é leve, decidida, selvagem. Ela é ela. É a Vida, é o umbigo. É onde tudo começou e onde tudo vai acabar. Hoje tudo vai acabar para Ela. Hoje a Vida cruzou-se com o vento e provou o mar. Hoje estas duas forças têm uma história para contar. O mar levou para longe as lágrimas dela e o vento soprou-lhe os cabelos. O Vento arrastou a Vida.

O que te posso eu fazer? Posso ajudar? Posso pensar numa solução melhor? Posso tocar-te no umbigo e sentir? Posso ficar com a tua Vida? Posso dizer que sempre tiveste uma solução para tudo? Posso dizer que nada te fará mudar de ideia?

Posso-te pedir ajuda? Dá-me algo para eu me agarrar, dá-me o chão, dá-me a Verdade. Dá-me o teu umbigo e leva-me à Vida.

A Revista


Decidi fazer aquilo que nunca tinha feito, sim, é verdade. Em 26 anos nunca comprei uma revista daquelas da moda, aquelas que apelam ao consumismo, aquelas que põe as mulheres a delirar e a estoirar com os cartões de crédito dos amantes. Aquelas que te dizem, pinta os olhos assim porque tá na moda, mete o creme Vichy porque tem água das termas gregas, enrola o cabelo na pasta de tomates de macaco porque amacia os fios de cabelo mais irrequietos (como é que a pasta sabe que o fio da direita é irrequieto e o da esquerda não é?). Sim meus amigos, eu gastei os meus 300 meticais (quase 10 EUR) numa merda destas. Parecia um louca, sentada do Dolce Vitta a beber um café e a desfolhar em alta velocidade a minha revista. A Revista. Já lá estavam as amigas da farra e nem sequer puderam ver a capa, eu não deixei, é a minha Revista.
Tenho que confessar que adoro moda, roupa, acessórios e essas porcarias que nos fazem ficar giras e elegantes, mas também tenho que confessar que ando a reboque dos outros, isto é, eu vejo as revistas que os outros compram, vejo-as, desfolho-as e devolvo. O bom disto? Actualizo-me a custo zero. Viva à contenção de custos. Sou bancária e basta.
Lá fui eu com a minha Revista. Fiquei doida com os vestidos (que não são para o meu bolso), com os sapatos (que nunca irei comprar, só quando for RICA), as sombras, e os efeitos que ELES conseguem com ELAS, os corpos luzidios das modelos, os SPA do grife e tudo o resto que está na minha Revista. Fiquei doidona, parecia uma miúda.
Esta compra, esta barreira que consegui ultrapassar na minha vida merecia uma comemoração, uma pijama party com a minha amiga Michele. Lá estávamos as duas, espalmadas na minha cama, vestidas à pijama sexy, a beber Gin e a discutir a Moda.
Lá estávamos as duas a ver garrafas de vinho de 4 mil euros, gaijas boas, homens sexys e cremes, cremes, mais cremes, porra para os cremes.

Um à parte: Confesso que tenho um trauma com os cremes, a minha avó obriga-me a passar o cartão na farmácia todos os anos (nas minhas idas à Metrópole). Vá filha, tens 26 anitos, a tua pele vai começar a envelhecer, trata-te. Ya avó, a verdade é esta: desde os 16 que compro os teus cremes, não os uso e a minha pele continua magnifica.

Que loucura. A Revista é um catálogo da La Redoute em versão mais chique, mais snob. É o apelo ao consumo numa altura de crise. É a ilusão que nós mulheres só seremos bonitas se seguirmos à risca a Moda. É, definitivamente, a minha Revista.

sábado, 20 de dezembro de 2008

A Aranha


Eu sou o que tu queres ver. Eu sou o que tu desejarias ver numa Mulher. Eu sou morena, sou sim. Sou uma espécie de curva imperfeita. Sou a estrada que nunca terminará.
Eu falo de mim, eu falo na primeira pessoa, eu inspiro-me, a minha escrita excita-me, leva-me onde nunca ninguém algum dia me levou, onde nunca ninguém teve coragem de me levar. Onde todos desistiram porque era demasiado real para ser verdade.
Eu sou a água que não corre em mais nenhuma veia, eu sou forte, certa, correcta e responsável e é por isso que me perco nestas palavras, é por isso que sou a única verdade quando mais ninguém o é. É por isso que sonho e luto.

Vocês, os Homens, são. São banais, carnais, egoístas. Estão comprados pelo poder, pelo sexo, pelo dinheiro, pela moda, pela fama, pelo Mundo.
Vocês são o reflexo da vida, do perfeito, da mentira, do quotidiano, das aparências.
Vocês olham para mim com desejo. Com vontade de ter, de alcançar, de comprar, de ser. Vocês querem mais mas não têm. Vocês são paredes lisas de azulejo molhado e eu sou a gota de suor que aí escorre.
Vocês são incipientes. Opacos. Frios. Vagos.
Vocês destroem a Vida, os pássaros, os bichos, as flores, as árvores....... Vocês repugnam-me. Metem nojo. Vocês não lutam por mim.

Eu trago tatuada uma Aranha. Eu trago um animal presente em mim e vivo como ele, mexo-me como ele. Eu trato todos por igual, porque todos pisamos o mesmo chão e respiramos o mesmo ar. Eu transformo-me quando quero e quando não posso. Eu sou inconveniente quando mais ninguém o é. Eu digo o que penso, o que sinto, e isso é mau. Eu transpareço todo e qualquer sentimento. E isso é mau.
Eu tenho gravado nos meus olhos bíblias sagradas que jamais serão decifradas. Eu morrerei em corpo e permanecerei viva em alma. Porque eu, eu sou a Aranha.

Ao contrário de vocês, eu amo e mostro. Ao contrário de vocês, eu choro e escondo. Eu nunca choro.

A minha Aranha leva-me para todo o lado e em todo o lado eu sou feliz. A minha Aranha é parte de mim, e assim como ela, eu tenho a estratégia delineada. Eu tenho o alvo quando mais ninguém o tem. Eu tenho a Teia que vocês precisam para se agarrarem. Eu tenho os fios que tecem a vida.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

A minha Viola


Isto é uma lição de vida. Isto é para quem não sabe, aprender. Isto é para tu e eu, eu e tu, sabermos a que mundo pertencemos e daí tirar conclusões. Isto é a diferença entre a minha pessoa e as pessoas. Isto é a minha Viola.
Dizia alguém: quase que choravas a contar a história da Viola. Sim, é verdade, porque tocávamos tão bem as duas, eu tinha uma especial queda para aquilo.

Quando pensava em correr, quando sonhava em namorar, quando caía de mota na praia e chegava a casa atrasada, quando saltava da janela e desfilava com o cabelo rapado, quando tudo e muito mais acontecia, bateram-me à porta. Bateram e levaram-me. A mim e à minha Viola.

A minha Viola de madeira tinha tatuado um dragão chinês, um dragão de fogo, que transmitia segurança, rebeldia, liberdade. As cordas foram colocadas ao contrário porque a mão que a tocava era diferente. A minha Viola custou caro, custou muito numa altura em que a vida não era de folias, era a vida do “aprende a dar valor”, era a minha vida, era a nossa vida que estava em jogo, estava à porta. Decide-te.

Eu e a minha Viola tentámos aprender a tocar juntas com pessoas de classe, tentámos, mas não conseguimos. Eu e a minha Viola acabámos na rua, rodeadas de gente, acabámos sozinhas, acabámos com os tabus e emitimos “A Música”.

Foram os anos mais quentes e fantásticos, mas explosivos e rebeldes, mas indecisos e irresponsáveis. Foram os tempos de uma menina que queria contrariar tudo e todos, uma menina que, para não o fazer sozinha, levou a sua Viola.

De facto há coisas na vida que marcam, arranham, trespassam. Há coisas na vida que crescem connosco e morrem contigo, com várias pessoas.
A minha vida mudou quando me bateram à porta e eu sabia que, naquele momento, a minha Viola deixaria de tocar. Eu sabia.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Um divagação matinal


Ei Gringo, don´t cross the river. There are many bandidos in the other side and they kill for money, I kill for nothing.


O meu Fato de Linho Branco


Em Terras quentes dizem os costumes que nos devemos vestir de branco. Foi o que fiz hoje. Mas, continuo a sentir o calor.

Em Terras quentes trabalha-se ao som de uma passada e a mente logo se desliga do real, dos problemas. Nesta Terra o que prevalece é o suor. Todo o resto é banalidade, futilidade. A pobreza não existe, o lixo é uma ilusão gráfica, os buracos são perturbações mentais NOSSAS. A corrupção é uma invenção ocidental. O branqueamento de capitais é uma sinónimo de, acabar com a fome.

O meu fato de linho branco sobressai no meio desta cagada toda. O meu fato é especial, tem bom corte, bom linho. Passo de cabeça erguida, ao som de Maya Cool, e abano a anca e digo, “não quero saber, nem pensar, sou só uma mulheri”.

Lá vai a Preta pelas ruas esburacadas, mal alcatroadas, pelos passeios partidos. Lá vai a Preta no Fato de Linho Branco, lá vai a Preta a ver gente descalça, unhas escuras, pés cansados, moscas, peixe seco, rádio sem pilhas.

Faço este caminho do costume, faço-o todos os dias, mas hoje faço-o no estilo. Só me faltam os leques, os homens de chapéu, as paredes amarelas e o quadro da Frida Kahlo.

O meu fato desliza sobre os meus pezinhos suaves e pelas ruas da Baixa da Cidade encontro de tudo, e de tudo é novidade pra mim, porque todos os dias as ruas são penetradas pela globalização infernal.

Montras empoeiradas, vidros rachados, grades gastas e comidas pelo sol africano deixam à vista olhares desesperados, todo o dia é dia de venda frustrada. Mas eu, eu passo aqui no estilo. Eu estou a virar Africana. Ignoro tudo, só não ignoro o meu Fato!

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Fui mordida na pálpebra




Realmente este País não está para brincadeiras quando todos os outros estão.
Ando certamente com uma vontade inabalável (já dizia o Gronroos) de matar alguém. Ahhhhhhhhhhhhhhh, que nervos.
E as coisas tinham que piorar quando saio de casa à hora do almoço e me dá uma coceira inabalável no olho esquerdo. Meus amigos, não cocem o olho sem terem a certeza que estão em África. Já só vejo à meia lua. Estou no Banco rodeada de informação e não a consigo decifrar. Acho que vou morrer.

No caminho, lá ia eu no meu super jipe, branco, pequeno, redondinho e qual é o meu espanto quando me ultrapassam pela esquerda, ahhhhhhhhhhh, que nervos. Segui o condutor. Lá ia ela, a Lorena, com os seus super cabelos postiços a fazer merda pela estrada fora. A Lorena, a super cantora moçambicana que tentou ser um ídolo mas desafina tanto que consegue transformar os dós em sóis, os rés em mis e os fás em não fás. Não canta, arranha, desgraça. Pediu-me desculpas pela cagada que fez na estrada, pediu desculpas com as super unhas francesas, fúteis, cumpridas, brancas e agressivas.

Chego ao parque e tenho uma aranha nas costas. Bem, essa parte já sabia, mas apanham-me sempre......... tinha uma aranha no vidro. Odeio aranhas. Aliás, tenho medo de aranhas. Fiquei em pânico dentro do Demo a ouvir Abba, I dooooooooooo, I doooooooo. I dont do nothing masé. Deu-me o ataque de asma ligeiro das 14 horas e bazei.

Lá fui eu, direita, recta, de saltos altíssimos, lenço ao pescoço a fugir dos buracos e da água da chuva, lá fui eu ser atropelada pelo meu colega da Seguradora. Porra! Mas tenho escrito o quê na testa hoje?
Não me viu o moço, coitadinho. E eu é que estou picada pelo mosquito. E eu é que tenho o olho a meio carvão. Porra. Arrastou-me o coleguinha, lá fui eu sentada em cima do capon do City Golf e os meus colegas gritavam em Moçambicanês: ELE QUER-LHI MATARRRRRRRRR
Ya people, ele quer matar-me, mas para não dar nas vistas decidiu fazê-lo às 14 horas em pleno dia da semana a sair do banco e eu a entrar no banco e todos a entrar no banco e o País a levantar dinheiro. Ya! Definitivamente ele tentou matar-me.

Entro no elevador, cheio de gente, muita GENTE. O ar condicionado avariou, a porta também e entala-me. Olho para o espelho. Porra, o olho está cada vez pior. Lá vamos todos a curtir até ao décimo oitavo andar e no oitavo as portas não fecham. Cinco minutos naquela agonia, já não aguento. Rifem-me. Vendam-me. Aceitam?

Vou tomar o meu café das 16 horas e aterra-me uma barata moçambicana no café, aterra triturada pela máquina. Olha, vou chorar. Foi o fim, odeio matar animais.

Já não vejoadkaldkalsdk nadaºaslaslasºçlaçsl

África Branca


Imagino-me tantas vezes, perdida na África Branca, perdida naquele calor exótico, naqueles temperos de comida sensual.
Queria ser pássaro e voar, aterrar no deserto, pisar a areia quente, levar o meu vestido de seda incolor, mostrar os seios, sentir na pele a suavidade dos panos.
Cabelos pretos compridos, cachos mal feitos, rebeldes, caem sobre as costas, olhos pretos que viajam entre o sol, pele queimada da vida.
Encontrei-me ali, de pés descalços sobre a rocha, o rio passa-me entre as pernas, a água fresca invade-me a alma, excita-me a vontade de ser animal.
Aquilo que me cobria a carne, tornou-se azul, mudou de cor, aceitou a força da natureza, consigo ser onda rebelde, vejo aquele mar, tão forte, tão mais do que eu. Dançam à minha volta, cheios de cores, fios, missangas, pele pintada, levam-me á loucura, levam-me ao Deus, ao supremo do amor, do sexo, da vida.
Deitada sou amada, penetrada como fogo na madeira. Levo o vestido vermelho, rasgado de tanto ardor, e com ele conheço os caminhos do Tantra e transpiro a alma gasta de tanta sabedoria.
Acordo, sou bordada a branco. Sentada na montanha, cobras rodeiam-me o pescoço, assobiam nos ouvidos de uma mulher viajada, arrepiam-me, chamam-me, querem mais, eles querem mais.
Não dou a mostrar a mais ninguém aquilo que me faz vibrar, quero ficar nesta árvore, pendurada, adormecida, ouvir os pássaros do esconderijo, criar maneiras de fugir, isto é real de mais para alguém acreditar, para eu acreditar.
Desapareço. Nasço nas ruas agitadas de Marrocos, tapada, cara coberta, ninguém me conhece, só descobrem a vida pelos olhos, a pureza não está escondida.
Corro com medo, medo desta arte tão cheia de paixão, destas barbas compridas, destes rituais da religião, como serão na noite privada? Como beijarão os lábios das mulheres de pele clara, da pele que não se mostra?
Naquelas casas de areia, naqueles quartos de laranja, vermelho e verde, o suor escorre-me pelo peito, afoga-se no vale do pescoço. A ventoinha velha desordenada arrasta-me este sentimento de traição.
Rebolo na cama, bebo o vinho da Vida, desvaneço na banheira de rosas. A água refresca me agora. Mostro finalmente as curvas e as gotas de óleo deslizam sem piedade pelas vértebras, contornam as nádegas, caem no chão preto, salpicam o tapete voador.
Naquela noite de flamengo, cravo vermelho na orelha, vestido comprido, seio apertado, sapato alto, danço nas guitarras, volto aos meus, aos descendentes, ao sangue latino. A renda rasga-se por entre as castanholas e os ciganos gritam de vibração.
Passo nas mesas, arrebato cada copo de tinto, sento-me nas cadeiras de madeira, cruzo a perna e mostro o corpo.
Acabo assim, como qualquer mortal, sem coração, sem ar, acabo com os olhos cheios de imagens, de sensações vividas, de pensamentos maus, impuros, mas antes, antes de enterrada na praia dos sonhos, cavalguei o cavalo preto. Sentada de pernas encostadas, segurei bem aqueles músculos, despi o vestido que se tornara cinzento, fiquei nua, sem roupa, sem a seda do principio, não quero mais cores, quero acreditar que continuo a viajar, quero ser de novo e para sempre Senhora do Paraíso.

África Branca


Imagino-me tantas vezes, perdida na África Branca, perdida naquele calor exótico, naqueles temperos de comida sensual.
Queria ser pássaro e voar, aterrar no deserto, pisar a areia quente, levar o meu vestido de seda incolor, mostrar os seios, sentir na pele a suavidade dos panos.
Cabelos pretos compridos, cachos mal feitos, rebeldes, caem sobre as costas, olhos pretos que viajam entre o sol, pele queimada da vida.
Encontrei-me ali, de pés descalços sobre a rocha, o rio passa-me entre as pernas, a água fresca invade-me a alma, excita-me a vontade de ser animal.
Aquilo que me cobria a carne, tornou-se azul, mudou de cor, aceitou a força da natureza, consigo ser onda rebelde, vejo aquele mar, tão forte, tão mais do que eu. Dançam à minha volta, cheios de cores, fios, missangas, pele pintada, levam-me á loucura, levam-me ao Deus, ao supremo do amor, do sexo, da vida.
Deitada sou amada, penetrada como fogo na madeira. Levo o vestido vermelho, rasgado de tanto ardor, e com ele conheço os caminhos do Tantra e transpiro a alma gasta de tanta sabedoria.
Acordo, sou bordada a branco. Sentada na montanha, cobras rodeiam-me o pescoço, assobiam nos ouvidos de uma mulher viajada, arrepiam-me, chamam-me, querem mais, eles querem mais.
Não dou a mostrar a mais ninguém aquilo que me faz vibrar, quero ficar nesta árvore, pendurada, adormecida, ouvir os pássaros do esconderijo, criar maneiras de fugir, isto é real de mais para alguém acreditar, para eu acreditar.
Desapareço. Nasço nas ruas agitadas de Marrocos, tapada, cara coberta, ninguém me conhece, só descobrem a vida pelos olhos, a pureza não está escondida.
Corro com medo, medo desta arte tão cheia de paixão, destas barbas compridas, destes rituais da religião, como serão na noite privada? Como beijarão os lábios das mulheres de pele clara, da pele que não se mostra?
Naquelas casas de areia, naqueles quartos de laranja, vermelho e verde, o suor escorre-me pelo peito, afoga-se no vale do pescoço. A ventoinha velha desordenada arrasta-me este sentimento de traição.
Rebolo na cama, bebo o vinho da Vida, desvaneço na banheira de rosas. A água refresca me agora. Mostro finalmente as curvas e as gotas de óleo deslizam sem piedade pelas vértebras, contornam as nádegas, caem no chão preto, salpicam o tapete voador.
Naquela noite de flamengo, cravo vermelho na orelha, vestido comprido, seio apertado, sapato alto, danço nas guitarras, volto aos meus, aos descendentes, ao sangue latino. A renda rasga-se por entre as castanholas e os ciganos gritam de vibração.
Passo nas mesas, arrebato cada copo de tinto, sento-me nas cadeiras de madeira, cruzo a perna e mostro o corpo.
Acabo assim, como qualquer mortal, sem coração, sem ar, acabo com os olhos cheios de imagens, de sensações vividas, de pensamentos maus, impuros, mas antes, antes de enterrada na praia dos sonhos, cavalguei o cavalo preto. Sentada de pernas encostadas, segurei bem aqueles músculos, despi o vestido que se tornara cinzento, fiquei nua, sem roupa, sem a seda do principio, não quero mais cores, quero acreditar que continuo a viajar, quero ser de novo e para sempre Senhora do Paraíso.